Áreas de estudo da Antropologia
Áreas de estudo da Antropologia
Se é verdade que
todas as ciências encontram-se fragmentadas em diferentes ramos de estudo que
permitem um estudo mais exaustivo e significativo não é menos verdade que a
Antropologia segue a mais lógica. Assim, a Antropologia tal como outras
ciências, subdivide-se em áreas de estudo específicos que permitem uma melhor
compreensão do objecto em causa. Evocar aqui os campos de estudo da
Antropologia, torna-se aqui imperioso, pois, permite-nos perceber a
Antropologia como uma ciência integrante a qual no seu desenvolvimento inicial
não fazia a distinção entre os diferentes domínios de conhecimento,
considerados na perspectiva de uma problemática teórica geral sobre o Homem. Na
visão de SANTOS (2002: 35) a designação genérica antropologia cobria grosso
modo no mínimo – e continua a integrar mas de forma independente – cinco
domínios de estudo fundamentais: a) a antropologia biológica (que
substitui a antiga antropologia física); b) a antropologia pré-histórica; c)
a antropologia psicológica; d) a antropologia linguística; e) a antropologia
social e cultural.
É importante realçar
que esta ordem de anunciação não reflecte realmente uma qualquer hierarquia
subordinativa entre elas, mas tão somente uma forma arbitrária de apresentação.
A antropologia biológica
No século XIX e nos
princípios do século XX, a palavra antropologia era empregue exclusivamente no
sentido de antropologia física, a ciência cujo objecto se centrava em
especial nos caracteres biológicos dos homens segundo a noção de raça, a
hereditariedade, etc. A antropologia física designa-se hoje de antropologia
biológica e não se preocupa especialmente com as raças e a sua
anatomia comparada (com as formas e mensurações dos cránios e esqueletos, da
cor da pele, dos olhos e do cabelo). A antropologia biológica, diz
essencialmente respeito ao estudo das variações dos caracteres biológicos do
homem no espaço e no tempo. Por outras palavras, est ciência debruça-se sobre o
estudo das relações entre o património genético humano e o meio geográfico e
social, relacionando as particularidades morfológicas e fisiológicas com o
contexto ambiental e com a evolução destas particularidades. Em consequência do
meio físico, a antropologia biológica toma em consideração os factores
culturais que influenciam o crescimento e o conjunto das transformações ou
fases sucessivas pelas quais passam os indivíduos desde a sua concepção
biológica até à maturidade.
O actual domínio da
antropologia biológica, na sua contribuição mais directa para evidenciar a
relação entre factores sócio-culturais e caracteres biológicos do homem,
debruça-se em particular sobre a genética das populações e participa,
cada vez mais – directa ou indirectamente – no debate sobre o derivado do inato
e o dependente do adquirido assim como sobre a sua contínua
interacção.
A antropologia histórica
A antropologia
histórica corresponde a um vasto programa de investigação sobre o passado
das sociedades desaparecidas e das actuais. A ela pode acrescentar-se a
antropologia pré-histórica e a etno-história.
A antropologia
pré-histórica, estuda a existência do homem num passado muito remoto,
relativamente ao qual não existem documentos escritos. Por esta razão, a
investigação faz-se recorrendo à busca de vestígios materiais deixados por
sociedades muito antigas e conservados no solo. Encontrar ossadas humanas em
determinados lugares, resulta em provas da existência do homem nesses locais,
mas também objectos de todo o género podem indiciar a sua actividade passada.
Pelo que acaba de ser dito se pode compreender que a antropologia pré-histórica
tem por finalidade a reconstituição das sociedades desaparecidas nos
seus diferentes aspectos.
A diferença entre a
etno-história e a antropologia pré-histórica reside no facto de o
etno-historiador trabalhar directamente com o tempo da oralidade local e o
antropólogo pré-historiador recolher o seu material de investigação em
escavações feitas no solo.
A palavra
etno-história foi criada pelos etnólogos americanos para referir os seus
trabalhos relativos às tentativas de reconstituição da história dos índios, a
partir das tradições e factos recolhidos. Por esta altura, era corrente
dizer-se que onde não havia documentos escritos não havia história. Obviamente,
a falta de documentos não evidencia a falta de história, mas tão somente a
falta. Assim, na origem, a etno-história correspondia ao estudo das sociedades
sem escrita, dependentes da memória oral, e ditas sem história. Ora não existem
sociedades sem história e a escrita não constitui um dado informativo evidente
quanto à revelação do passado.
A antropologia linguística
Este domínio
corresponde ao confronto entre a antropologia e a linguística enquanto ciência
que estuda a linguagem como parte integrante do património cultural de uma
sociedade. Com efeito, a linguagem corresponde a uma realidade social
fundamental através da qual os membros de uma sociedade comunicam e exprimem as
suas ideias, os seus valores, as suas preocupações, etc. Pela sua amplitude, a
linguagem constitui um domínio cuja problemática pressupõe uma abordagem
necessariamente interdisciplinar. Sem o estudo da língua não seria possível
compreender as suas categorias afectivas e cognitivas, as quais constituem
precisamente o campo de estudo da etno-linguística.
Segundo Claude
Lévi-Strauss (1958), a linguagem pode ser encarada, nas suas relações com a
cultura, segundo três aspectos. Todos eles são fundamentados na observação e
levantam problemas particulares, para além de constituírem o ponto de partida
de concepções explicativas sobre as relações entre a linguagem e a cultura:
1) A linguagem
corresponde a um dos aspectos da cultura;
2) A linguagem é
igualmente uma produção cultural, na medida em que reflecte, pela
natureza e projecção dos seus sistemas simbólicos, certas características de
uma cultura;
3) Finalmente, a
linguagem corresponde a uma condição da cultura. É um facto observado,
que a linguagem assume, totalmente ou em parte, a permanência de certos
aspectos da cultura.
Num plano teórico,
ela própria é uma cultura se a considerarmos um sistema de comunicação privilegiado
que fornece a chave de acesso aos sistemas particulares de comunicação como aos
diversos aspectos da cultura.
Através do estudo da
língua é possível esperar compreender, por exemplo, as categorias mentais do
parentesco, cristalizadas nas nomenclaturas dos termos de parantesco e
reconstituir as sagas genealógicas que permitem retraçar as histórias
familiares e identificar as categorias parentais operatórias.
O estudo da língua
na forma oral é o único meio obrigatório que o investigador tem para aceder à
sociedade e à cultura em observação. Diga-se incidentemente que alguns dos
quadros linguísticos referidos, exclusivamente orais, se alteraram quando os
antropólogos iniciaram o estudo destas sociedades e obrigatoriamente as suas
línguas, começando a transcrevê-las foneticamente e em seguida a fixar a
sintaxe.
A antropologia psicológica
A antropologia
psicológica define-se como o domínio que se interessa pelo estudo dos
mecanismos do psiquismo humano, na sua interacção com a permeância social. O
presente domínio não tem por objectivo o indivíduo, enquanto actor particular,
o qual pertence ao domínio da psicologia, mas define o encontro entre a
antropologia e a psicologia no que corresponde à necessidade de compreensão da
subjectividade que preside à acção dos indivíduos em sociedade. Ou seja,
corresponde à necessidade de passar do objectivismo ao subjectivismo. Neste
campo, entronca o fenómeno de representação sobre a realidade social e a acção
derivada da percepção desta mesma realidade pelos diferentes acores sociais.
A antropologia social e cultural
Se avançarmos do
estudo do passado para o presente da dimensão cultural, entramos no campo de
estudos da antropologia social ou cultural; o objeto desta área da
antropologia são as formas em que as sociedades percebem o mundo e como
organizam o seu cotidiano.
A antropologia
social e cultural estuda a cultura de um grupo tanto na sua dimensão
instrumental, chamada de cultura material, que se refere às coisas que os
homens produzem e com as quais intervêm na natureza, quanto na sua dimensão
cosmológica-cognitiva-organizacional, que abrange os sistemas de ideias e de
valores, através dos quais se organiza a percepção do mundo.
Esta dimensão diz
respeito aos elementos ideológicos que compõem a definição de cultura (que
posteriormente estudaremos), a saber, a língua, a religião, o sistema de direito,
etc.
A parte
organizacional da antropologia social ou cultural diz respeito às formas que
os grupos humanos concebem para estabelecer a circulação dos indivíduos no seu
interior, isto é, as regras de casamento e de parentesco, as divisões em grupos
menores como clãs, fratrias e linhagens.
Em outras palavras,
a antropologia social e cultural diz respeito a tudo que
constitui uma sociedade: seus modos de produção econômica, suas técnicas,
sua organização política e jurídica, seus sistemas de parentesco, seus sistemas
de conhecimento, suas crenças religiosas, sua língua, sua psicologia, suas
criações artísticas, suas técnicas, etc.
Para terminar com
esta diferenciação das áreas da antropologia temos que nos referir rapidamente
por que denominamos a dimensão cultural no presente como antropologia social ou
cultural. Basicamente, é uma diferenciação derivada de interesses distintos das
escolas antropológicas inglesa e americana.
Os antropólogos
ingleses se interessaram pela organização social e política dos grupos que
estudavam, e assim, focaram seus estudos na ideia de sociedade, por isto a
escola foi chamada de antropologia social (embora alguns, como
Malinowski, tenham utilizado na sua produção o conceito de cultura).
Já os americanos se
interessavam pelas variações culturais, pela sua difusão e como os indivíduos
são moldados pela cultura; por isto se denominou a essa escola como antropologia
cultural ou culturalismo.
Bibliografia
ERICKENS, Thomas Hylland. NIELSEN, Fin Sivert. História da Antropologia. 4ª ed. Editora Vozes, Petrópolis, RJ, 2010.
SANTOS, Armindo dos. Antropologia Geral: etnografia, Etnologia, Antropologia Socal. Universidade Aberta, 2002.
COLLEYN, Jean-Paul. Elementos de Antropologia Social e Cultural. Edições 70, Lisboa, 2005.
TITIEV, Mischa. Introdução à Antropologia Cultural. 9ª ed. Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 2002.
LAPLANTINE, François. Aprender Antropologia. São Paulo, Brasiliense, 2003.
Comentários