A Agricultura e a Política Laboral em Manica e Sofala
A Agricultura e a Política Laboral em Manica e Sofala
Introdução
Sendo
várias as actividades desenvolvidas pela Companhia de Moçambique em Manica e
Sofala, a agricultura foi uma das mais importantes. Esta importante actividade
económica desenvolveu-se a nível de grandes plantações viradas para a produção
de matérias-primas, a nível da agricultura colona produzindo cereais e alimentos
em geral, para o mercado para além do nível familiar cuja finalidade era a
subsistência do campesinato africano, incluindo a venda do excedente.
A Agricultura
A
nível da agricultura a Companhia cedeu terras a algumas companhias, aos colonos
bem, como manteve algumas terras nas mãos dos camponeses africanos. Deste modo
a agricultura nos territórios da companhia de Moçambique desenvolveu-se a três
níveis: a nível das companhias arrendatárias (Companhia de Gorongosa, Companhia
de Luabo, Sociedade açucareira da África oriental, Companhia colonial do Búzi,
etc), que receberam terras da Companhia; a nível da população colona; e ainda a
nível da pequena produção familiar camponesa.
A Agricultura de Plantação
A
produção agrícola em Manica e Sofala desenvolveu-se em duas vertentes
principais: desenvolvimento de plantações e instalação de farmas.
As Plantações
Viradas
para a produção de matérias-primas para o mercado externo como a borracha, o
chá, o algodão a cana-de-açúcar, etc. Grandes extensões de propriedades
monoculturais e, portanto, com grandes exigências em mão-de-obra, as plantações
foram desenvolvidas pela própria Companhia, por algumas companhias subarrendatárias e também por colonos nas margens dos rios Zambeze, Buzi, Save
e no litoral.
Embora
as concessões tivessem sido realizadas a partir da implantação da Companhia só
por volta de 1900 é que começaram a aparecer os primeiros resultados, o que não
de estranhar tendo em conta o facto de ser a plantação um investimento de longo
prazo.
Entre
as principais plantações no centro de Moçambique temos as de coqueiros,
bananeiras e borracha desenvolvidas pela Companhia colonial do Búzi com 321 500
hectares. Por outro lado a Companhia de Moçambique tinha por sua conta palmares
em Chiloane e Save, etc.
Entretanto
nas terras da Companhia foram sem dúvida as plantações de cana-de-açúcar que
mais se notabilizaram tanto pelo volume dos investimentos envolvidos, como pela
quantidade de mão-de-obra que mobilizavam, em detrimento da produção familiar
de subsistência.
As
plantações de açúcar começaram a ser implantadas em 1900 com a criação da
Sociedade açucareira da África oriental que veio a fundar a fábrica de Marromeu
que começou a laborar em 1902.
Em
1910 foi fundada por Hornung a Companhia açucareira The Sena Sugar Factory Ltd
que fundou a fábrica da Caia. As dificuldades das diferentes companhias
decorrentes da exiguidade de capitais e das constantes calamidades naturais
levaram a integração de todas elas na Sena Sugar Factory Ltd. Em 1920 passaram
a integrar a Sena Sugar Estates de Hornung, também com propriedades em Mopeia e
Luabo.
Entre
as culturas das plantações lugar de relevo teve também a produção de algodão.
As principais empresas algodoeiras no território da companhia foram a Mac Callum,
The Rodesian Cotton, Companhia agrícola de Moribane, etc. Entretanto o maior
contributo em algodão, tal como em borracha, teve origem na produção familiar.
As Farmas
Completavam
a actividade das plantações e estavam direcionadas para a produção de cereais,
frutas e hortícolas. O mercado interno e externo assim como o consumo eram o
principal destino desta produção.
A Agricultura Colona
A
cedência, para exploração das terras de Manica e Sofala a companhia de
Moçambique não foi, como vimos, uma imposição da realidade económica portuguesa
pelo que não significava que Portugal abdicava daquelas terras, muito pelo
contrário. Como tal as autoridades portuguesas procuravam sempre que a
exploração da região e na companhia estivesse sempre representado Portugal.
Deste
quadro surgiu que uma das obrigações da companhia no âmbito da exploração das
terras de Manica e Sofala fosse a de instalar e apoiar na prática da
agricultura, durante os primeiros cinco anos de actividade, mil famílias de
colonos portugueses.
Neste
sentido impunha-se que a Companhia providenciasse habitação, terrenos para
agricultura bem como alfaias, fertilizantes sementes, etc., cujo reembolso
seria feito a longo prazo.
Não
obstante os primeiros anos de presença de portugueses em Manica e Sofala foram
marcados por acentuados níveis de mortalidade, desaparecimentos e fugas para os
territórios vizinhos para além de não raras vezes muitos colonos terem trocado
a agricultura pelo comércio.
O
resultado desastroso deste plano foi o corolário de várias situações conjugadas.
Entre esses factores registe-se que os colonos enviados a Manica e Sofala não possuíam nem os capitais nem a preparação técnica e a experiência prática
necessários para o sucesso da actividade que lhes era proposto desenvolver. Envoltos
neste colecte de forças os colonos mantiveram-se totalmente dependentes da
Companhia quanto a investimentos em infraestruturas, assistência técnica e
fornecimento de mão-de-obra.
A
experiência viria a ser relançada a partir de 1910 com a subida de João Pery de
Lind a governador da região e que se mostrou um firme defensor dos interesses
dos colonos. Durante o governo de Pery de Lind a companhia começou a ganhar
confiança na agricultura colona o que levou a que esta intensificasse a
política de atracção de colonos que iam se fixar na região com consideráveis
vantagens. Nesta altura os colonos passaram a beneficiar de crédito agrícola
(aluguer de máquinas, fornecimento de fertilizantes, distribuição de sementes e
sacos), assistência técnica, cedência de terras férteis, facilidades na
aquisição de mão-de-obra assim como facilidades de pagamentos das dívidas contraídas.
Mais
tarde a agricultura colona em Manica e Sofala teve um considerável apoio de
instituições especialmente criadas para o efeito, entre as quais estava a Caixa
de Crédito Agrícola, criada em 1928 e que permitiu a racionalização da política
de assistência financeira à agricultura colona e a Associação dos agricultores
de Manica e Sofala que melhorou os mecanismos de defesa dos interesses dos
colonos, principalmente ao nível da Repartição do trabalho Indígena, onde
faziam-se representar por dois delegados.
A
completar os esforços das autoridades da Companhia para dar força a agricultura
colona, a Direcção de Agricultura foi transferida para Vila Pery, centro da
agricultura colona, em 1928.
O
desenvolvimento da agricultura colona, contrariamente a de plantação, ocorreu
no espaço e especificidade antes reservados aos camponeses africanos pelo que
desde a sua implantação surgiram atritos com esse sector da população de Manica
e Sofala. Deste modo até 1936 as relações entre os agricultores colonos e
africanos foi de uma certa concorrência e hostilidade pois os primeiros
pretendiam transformar os africanos em força de trabalho barata assim eliminar
a concorrência no mercado em especial na venda do milho. Este conflito seria
suprimido com a criação da Comissão Directora do Comércio de Milho (CDCM) em
1936, um organismo de coordenação agrícola para assistência directa aos agricultores
com a função específica de controlar a produção distribuição e comercialização
do milho.
A
política da CDCM mostrou-se claramente contrária ao campesinato africano
dirigindo as suas acções para a protecção do mercado local e externo de milho
para a produção dos colonos, monopólio da rede comercial do milho no território
da Companhia e rejeição do milho dos camponeses africanos ou adopção de
políticas discriminatórias de preços.
O
resultado deste desenvolvimento foi uma evidente regressão da agricultura
africana contrastando com um crescimento bastante acentuado da agricultura
colona. A título de exemplo temos que em 1939 os 533 agricultores colonos
ocupavam 664 299 ha de terras aráveis, tendo produzido 121 642 sacos de milho
contra 4 062 dos africanos que eram numericamente muito superiores aos
europeus. Para além disso, enquanto o milho dos colonos era vendido a 2$60, o
dos africanos era colocado a 1$10.
O Campesinato Africano em Manica e
Sofala
Paralelamente
a agricultura colona e as plantações desenvolveu-se a agricultura camponesa,
que era aliás a principal actividade nas terras de Manica e Sofala antes da
penetração estrangeira. Na fase em que estamos a estudar os africanos cultivavam
com notoriedade o algodão, o milho, o arroz, a mandioca a mapira, a mexoeira, o
feijão, as oleaginosas, etc.
Também
competia aos africanos a extracção da borracha.
A
cultura do algodão, importante para as indústrias metropolitanas, contava com a
supervisão e apoio da Companhia em sementes e ocupou o primeiro lugar nas
exportações. Quase toda a produção do algodão era era comprada pela Companhia a
preços por ela fixados.
O
sistema de culturas forçadas de algodão introduzido em 1926, não chegou a
funcionar no território o que não significa que os produtores camponeses se
tenham mantido à margem do controle da companhia no processo produtivo. Embora
fazendo uso dos seus meios de produção o produtivo incluindo a comercialização,
estava directa ou indirectamente sob o controle do capital.
A
comercialização da borracha extraída pelos africanos tinha igualmente considerável
importância durante os primeiros de dominação colonial.
Pela
sua importância como fonte de receitas bastante rentável, devido aos baixos
custos de produção, a companhia estabeleceu em 1937 o monopólio da colheita e
comercialização da borracha, reservando para si locais e florestas exclusivas.
Muitos camponeses que até ai beneficiavam de dos preços mais remuneradores
oferecidos pelos comerciantes indianos espalhados no interior abandonaram a
extracção.
A
cultura de arroz foi incentivada na Beira e em Cheringoma. Tal como o algodão a
Companhia distribuía as sementes aos produtores comprando depois o produto.
O
campesinato especializou-se na produção do algodão e na exportação da borracha,
dois dos principais produtos do território.
Além
disso o campesinato abastecia o mercado interno com produtos como o milho, a
mapira, etc., produtos destinados à alimentação dos trabalhadores nas empresas
e outros sectores.
A Política Laboral da Companhia de Moçambique
O
capitalismo colonial só podia se desenvolver através do domínio e exploração do
trabalho assalariadonas plantações, nas farms, explorações mineiras e noutros
sectores da economia.
Contudo
os campponeses moçambicanos, possuindo meios de vida próprios não tinham no
traalho assalariado a sua fonte de sobrevivência.
Para
conduzir os camponeses, com terras e outros meios, a tornarem-se assalariados
foi necessária desde logo uma violência extraeconómica capaz de arrastar a
força de trabalho do campesinatodo território para o trabalho assalariado e,
também forçado.
O
campesinato que tinha na produção doméstica uma fonte de rendimentos
suficientes para as suas necessidades, manifestava-se pouco receptivo às
solicitações do mercado de trabalho.
Por
esta razão o problema de mão-de-obra colocava-se no centro das preocupações das autoridades da Companhia. Afigurava-se
pois de importância capital assegurar o fornecimento a baixos preços para garantir
o desenvolvimento da economia colonial.
A
primeira medida tomada para a compelir o campesinato para o trabalho assalariado
fo a institucionalização do imposto em dinheiro. E para centralizar o
recrutamento e a distribuição de mão-de-obra foi criada, 1895, a
Inspecção-geral dos Negócios Indígenas, repartição central responsável pela
direcção superior de todos os assuntos relativos às relacções com a população
africana, particularmente na cobrança de impostos, fornecimento de
trabalhadores para os serviços da Companhia e de particulares bem como a
relação com os chefes tribais.
Em
1907 entrou em funcionamentoa principal legislação de trabalho aprovada pelo
Governo português para o teritório nomeadamente, o Regulamento Geral do
Trabalho dos indígenas no território da Companhia de Moçambique, o Regulamento
para o fornecimento de indígenas a particulares no território de Manica e
Sofala e o Regulamento para o recrutamento de indígenas de Manica e Sofala.
Três Aspectos Essenciais Ressaltam
Destes Regulamentos:
a) A
institucionalização do trabalho forçado. Impunha-se por lei a obrigatoriedade
de prestação de trabalho assalariado por todos os indivíduos em idade activa.
Nos termos dessa lei o camponês era colocado perante o dilema: ou vender
coercivamente a sua força de trabalho ou dedicar-se às culturas viradas para a
exportação. Em ambos os casos a agricultura familiar de subsistência era
preterida pelos interesses do capital.
b) Estabelecimento
de um sistema de controlo rigoroso da força de trabalho. O governo da Companhia
determinou que cada trabalhador devia ser portador de um certificado declarndo
o tempo de serviço prestado e as respectivas datas de início e fim do
contracto.
Em 1926/7 foi introduzida a
caderneta individual de identificação indígena para todos os indivíduos do sexo
masculino com idade aparente comprovada superior a 14 anos.
Os infractores podiam ser punidos
com pesadas penas como o trabalho correccional pago a 40% do salário normal.
c) Interdição do
recrutamento de trabalhadores para fora do território da Companhia.
A
chamada emigração clandestina foi considerada crime e, como tal punida punida
com severas penas que iam até 20 meses de trabalho forçadosem remuneração. Um
sistema de policiamento foi organizado para impedir a fuga de trabalhadores
para fora do território nomeadamente Rodésia do Sul, Niassalândia África do Sul
Ou outras partes de Moçambique.
Consequências Destas Medidas
- Muitos camponeses e trabalhadores abandonavam as suas aldeias, outros desertavam dos locais de trabalho
- Falta de mão-de-obra. Para minorar o efeito desse fenómeno a Companhia teve que recrutar trabalhadores de Nampula Tete e Zambézia. Criou a associação do trabalho Indígena para a angariação de trabalhadores para os serviços particulares. Recrutou menores para trabalhadores de limpeza, abertura de caminhos-de-ferro e culturas para alimentação dos trabalhadores.
Referências
bibliográficas
MINEDH. Módulo 7 de História: O Colonialismo Português em Moçambique de 1890 a 1930. Instituto De Educação Aberta e à Distância (IEDA), Moçambique, s/d.
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