O Estado dos Mwenemutapa: Formação, Sistema Administrativo, Formas de Conquista

O Estado dos Mwenemutapa

Formação

O estado de Mwenemutapa nasceu da desintegração do estado do Zimbabwe por volta do ano 1440-1450, quando Mutota juntamente com os seus exércitos invadiu o planalto Zimbabweano vindo fixar-se em Moçambique.

A decisão de Mutota mudar-se para o próximo do rio Zambeze com uma parte da população karanga foi motivada pelos seguintes factores:

a) Políticos: As contradições surgidas entre os chefes dos clãs Rozwi e Torwa pelo controlo do comércio com a costa.

b) Económicos: O Zambeze é uma óptima via de comunicação e de transporte de mercadorias.

c) Demográficos: O aumento populacional numa região pouco fértil, como era a região do grande Zimbabwe.

d) Naturais: A redução do caudal das águas do rio Save, dificultando a comunicação o com a costa.

Formas de Conquista

Como fizemos referência anteriormente, cerca de 1450, Mutota, o chefe das populações Karanga evadindo-se do planalto do Zimbabwe reúne numerosos guerreiros e através de violentas campanhas militares submete a maior parte da população das imediações do Zambeze.

Embora tenhamos feito menção a alguns factores, não são muito claras as razões dessa invasão. Na sequência desta conquista do norte do planalto Zimbabweano pelos exércitos de Mutota, desenvolveu-se entre os rios Mazoe e Luia o centro dum novo estado, chefiado pela dinastia dos Mwenemutapa.

Após a morte de Mutota, tomou o poder seu filho Matope que prosseguiu as acções de conquista, estendendo o seu poder por vários reinos vizinhos. Assim, além do  núcleo central, o estado dos Mwenemutapa incluia vários estados vassalos, nomeadamente Sedanda, Quiteve, Manica, Bárue...

Sistema Administrativo

O império dos Mwenemutapa era, como dissemos, uma aliança de tribos Chona que se agruparam sob a autoridade dum chefe da tribo Rowzi. Este reinava como um grande senhor, tendo vários outros reis ou chefes sob a sua autoridade. Estes reis eram obrigados a pagar um imposto anual ao Mwenemutapa.

Cada um deles vivia numa cidade de pedra - Zimbabwe. Os reis vassalos tinham poder administrativo sobre os seus reinos, mas eram obrigados a prestar contas ao senhor máximo, ou seja ao imperador Mwenemutapa.

Os reis tinham também poderes de ordem política, religiosa e judicial, isto é, tinham poderes de cobrar Impostos, julgar questões e manter a ordem e disciplina, mas tudo em nome do Mwenemutapa.

Entre os principais estados vassalos ou subordinados podemos citar Bárue, Quiteve, Manica, Sedanda, etc.

Atenta ao mapa seguinte ilustrando os estados dos Mwenemutapa.

O Império dos Mwenemutapa

Estratificação Social

De uma forma geral, a sociedade chona caracterizava-se pela coabitação no seu seio de dois níveis sócio-económicos distintos: a comunidade aldeã e a aristocracia dominante.

A comunidade aldeã - Era constituída pelo maioria da população na qual evidenciavam-se os camponeses.

A aristocracia dominante – composta pelos homens que tinham a seu cargo as tarefas político-administrativas.

O chefe supremo no estado dos Mwenemutapa era o Mambo, que era coadjuvado nas suas funções pelas suas três principais esposas (Mazarira, Inhahanda e Nambuiza) que realizavam funções importantes na administração, e por nove altos funcionários responsáveis pela defesa, comércio, cerimónias religiosas, relações exteriores, festas, etc.

O Mambo, como chefe supremo, devia tratar com equidistância a todos os súbditos e, nesse sentido, devia desenraizar-se do seu núcleo familiar.

É por isso que no acto de entronização o mambo devia praticar o incesto.

O poder do mambo era tão grande que a sua morte era seguida de um ritual em que durante os oito dias de luto que antecediam a indicação do novo mambo, criava-se um ambiente de caos, com todo o tipo de desacatos que só paravam com a indicação do sucessor, ou seja, o restabelecimento da ordem. Durante este príodo o estado ficava a cargo de um “substituto interino” designado nevinga e que era morto após consumada a sucessão.

Ao nível mais baixo da administração estava o mukuro ou Mwenemusha que era o chefe da comunidade aldeã. Este era o mais velho da comunidade e o seu poder transmitia-se por herança.

Outras camadas que não faziam parte de nenhum destes grupos eram as dos artesãos que trabalhavam o ouro, o ferro e o cobre; dos comerciantes que faziam a troca dos produtos locais com mercadores árabes e portugueses ambos vindos da costa.

Estrutura Administrativa dos Mwenemutapa

Relações Aristocracia /Comunidade Aldeã.

A articulação entre a Aristocracia Dominante e a Comunidade Aldeã estava baseada em relações de submissão e exploração materializadas pelas obrigações e direitos que cada uma das partes tinha para com a outra. As comunidades aldeãs (mushas) sob a direcção dos mwenemushas, garantiam com o seu trabalho a manutenção e a reprodução social de toda a sociedade Chona. Portanto os camponeses achavam-se numa posição de submissão e de exploração pois estando os chefes isentos das actividades produtivas, cabia aos camponeses fornecer parte da sua produção, como tributo, aos chefes. Portanto os chefes viviam da produção dos camponeses.

Formas de Reprodução ou de Reforço do Poder

Muito bem caro aluno, agora vamos analisar um aspecto importante na vida dos estados de Moçambique, que é perceber como é que os chefes eram aceites pelas comunidades a ponto de lhes pagar tributos e respeitálos como chefes. De onde obtinham os chefes, tanto poder?

Veja a seguir...

Entre as populações Karanga era muito importante o culto aos antepassados, pois as comunidades karanga acreditavam que a sua vida só podia decorrer normalmente se os antepassados quisessem. A chuva, as doenças, as guerras, tudo dependeria da vontade dos antepassados.

Mas como podiam os Karanga saber aquilo que os antepassados desejam?

Era normalmente o Mwenemutapa que servia de intermediário entre os vivos e os antepassados. Além do Mwenemutapa existiam algumas pessoas que o povo acreditava terem poderes especiais para dialogar com os antepassados e essas pessoas eram muito respeitadas.

E como é que ele conseguia provar às massas que ele se comunicava com os antepassados?

Sendo o rei considerado de origem divina, o povo acreditava na divindade de Mwenemutapa até ao ponto de não ver a sua cara quando falava. Sempre que o rei se dirigisse ao povo falava atrás de uma cortina.

O povo ouvia a sua voz mas sem ver a cara.

Todo este conjunto de representações que o povo tinha, o sistema tributário e o comércio à longa distância asseguravam a reprodução do edifício social chona e das desigualdades sociais existentes, ou seja,  garantiam a lealdade popular à figura do rei.

Quanto ao sistema tributário, embora de carácter simbólico, cada uma das comunidades aldeãs tinha a obrigação de dar qualquer coisa ao monarca regularmente para além da renda em trabalho de sete (7) dias prestados por mês.

No respeitante ao comércio à longa distância, até do ponto de vista económico garantia a importação de produtos asiáticos que na sociedade Chona ascendia à categoria de bens de prestígio (tecidos missangas de vidro, louça de porcelana e de vidro, etc.).

A Decadência

Fundado nos meados do século XV o estado dos Mwenemutapa mantevese firme até princípios do século XIX, altura em que caiu diante das invasões Nguni. Até esse momento, o estado passou por um processo gradual de desagregação resultante de conflitos internos e da penetração mercantil portuguesa na região.

Os conflitos internos nos mwenemutapa iniciaram logo após a morte de Matope em 1480, resultando das disputas pelo poder e pelo controlo do comércio provocou e que culminaram com a divisão do império.

Esses conflitos agravaram-se devido ao incitamento dos árabes à revolta dos fumos contra o Mwenemutapa. Era objectivo dos árabes que os fumos se tornassem independentes do Mwenemutapa deixando de lhe pagar o tributo em ouro. Assim, os árabes podiam obter dos fumos maiores quantidades de ouro em troca dos panos, missangas e louças que traziam.

Um dos primeiros mambos a declarar-se independente do Mwenemutapa foi o Changa, do reino Butua, um grande guerreiro e hábil dirigente a quem os árabes chamaram "emir", levando a que ele e seus sucessores, passassem a ser conhecidos por Changamire.

As lutas entre os changamire e os mwenemutapa, especialmente os sucessores de Matope, enfraqueceram progressivamente a unidade e a organização do império.

A juntar aos problemas internos, no princípio do século XVI iniciou a fixação dos portugueses em Sofala e na Ilha de Moçambique.

Após a sua fixação, os portugueses, esforçaram-se por expulsar os árabes e tomar o controle do comércio no Índico, além de aproveitar as rivalidades entre os reinos locais para penetrar no interior em busca das minas de ouro.

No entanto, continuavam a existir dois grandes reinos rivais: Changamire e Makaranga. Os Changamire tinham como aliados os reinos de Quiteve, Torwa e Manica. Os Makaranga eram aliados dos Bárue e de Manica(?).

As guerras entre estes dois rivais continuaram durante décadas até que o Changamire Dombo impôs o seu domínio em toda a região do Limpopo até Zambeze e que compreendia os reinos Rozwi e Karanga. Embora não tivesse tomado o título de Mwenemutapa e continuasse a usar o título de Changamire Dombo era na verdade o sucessor dos antigos Mwenemutapa na autoridade que soube manter.

Com o tempo, mais portugueses foram chegando e, pouco a pouco, o comércio recomeçou.

O domínio de Changamire durou até o ano de 1830 aproximadamente, data em que os guerreiros Zulu destruíram as cidades no momento das suas célebres invasões que mais tarde estudaremos.

Referências bibliográficas

MINEDH. Módulo 6 de História: Os estados em Moçambique e a Penetração Mercantil Estrangeira. Instituto De Educação Aberta e à Distância (IEDA), Moçambique, s/d.

Comentários